"Está na moda falar em consciência negra, para bem ou para mal, todos já ouviram este ou aquele falar nesse tema. No entanto, será que todos têm noção do seu significado e importância? Todos tão cansados de saber; que o negro sofreu, foi humilhado, e obrigado a negar sua identidade; incentivado a ter vergonha de si próprio, de sua história, de seu presente… Isso todos já sabem, ou pelo menos deveriam saber.
O processo de escravidão foi dura e deixa marcas até hoje, pois mesmo depois da abolição o racismo permaneceu detonando as nossas condições de vida, fechando portas, nos exterminando. O racismo é tão forte, que está disfarçado em coisas que a gente nem imagina: na política, na cultura, na religião, no nosso dia a dia. Uma coisa importante é que o racismo, não é só quando alguém insulta ou olha com desconfiança, mas é principalmente o facto de os negros terem menos acesso ao ensino, a moradia digna, saúde, trabalho, renda etc – em todos esses gráficos nós estamos em desvantagem…
Alguma coisa tem que ser feita. Mas quem vai fazer? Será que quem tem o poder vai abrir mão do seu privilégio? O Racismo foi importantíssimo pra construir o capitalismo (esse sistema que a gente vive). Toda a riqueza dos Estados Unidos e Europa são fruto da escravidão e colonização dos paises africanos, asiáticos e americanos. O sangue dos nossos ancestrais garantiu a qualidade nos paises de 1º mundo. Exterminaram os indígenas, milhões de africanos morriam na travessia do atlântico; Os povos “não brancos” foram roubados nas suas riquezas materiais; intelectuais; culturais etc…
Em toda história da humanidade, onde teve opressão teve resistência. E ela ocorreu, desde o primeiro momento: Na África ou no Brasil, nos Estados Unidos ou na Índia… Sempre teve resistência; luta. No Brasil se formaram quilombos; em África, guerrilhas das mais variadas, no Haiti revolução. É lindo conhecer a historia do Haiti e como aqueles bravos guerreiros deram fim às escravidões, enfrentaram heroicamente Napoleão. O problema é que pagam até hoje o preço da sua liberdade.
O que a consciência negra tem a ver com tudo isso?
Para as elites se manterem no poder, não adianta apenas reprimir, é necessário fazer o dominado acreditar que é inferior e que não tem outro jeito: “É assim mesmo, sempre foi e sempre será”, “Deus quis que fosse assim”. As elites racistas tentaram de tudo para manter-se no poder. Usaram a religião, a ciência, a moral, a estética, a cultura… cada um desses pontos dá um livro. O facto é que se o oprimido tem auto-estima, ele luta.
O nome “consciência negra” foi forjado na luta contra o colonialismo e o racismo como uma resposta a essa questão. Pois não tem luta sem auto-estima, sem amor próprio, sem conhecermos da nossa historia e nos orgulharmos dela… por outro lado, não basta só ter orgulho e não lutar. Então as duas coisas devem estar juntas: Orgulho e luta.
A consciência Negra é algo que temos que ter todos os dias. Devemos conhecer a historia do nosso povo, conhecer, valorizar e dar continuidade à nossa tradição cultural, mas ao mesmo tempo buscar sempre nos organizar e lutar contra o racismo e os seus impactos na nossa vida. A luta sem identidade é vazia… A identidade sem luta é mentirosa.
Mas o que isto tem a ver com o HipHop?
Simplesmente o facto de que o hip hop é parte dessa luta. É uma expressão de luta da juventude negra, nos Estados Unidos, na França ou Brasil. Apesar de trazer na sua composição forte influência hispânica (os descendentes dos vários paises da América latina nos EUA), o hip hop foi muito importante no fortalecimento da identidade negra. Dos Public Enemy aos Racionais MC´s, dos Dead Press aos PosseMenteZulu, fomos influenciados pelo orgulho de ser negro, pela crítica à nossa situação, pela sede de transformação. O hip hop é parte da luta negra, por um mundo verdadeiramente humano. Trás elementos da cultura africana na sua composição, é o nosso jeito de fazer arte. É continuidade do movimento negro, mas com características próprias.
O problema é que estamos a perder isso. A cada dia o mercado vai tomando conta de nossa manifestação. As rádios vão selecionando os grupos mais comerciais e vazios, nos muros aparecem cada vez menos personagens negros e por aí vai. Felizmente a resistência permanece, pois no dia em que o hip hop deixar de ser luta negra contra a desigualdade, contra o racismo, contra a situação que a periferia e favela tão submetidas. O povo negro perderá um importante escudo. O hiphop perderá o sentido de existência".
Texto escrito por DN
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